Ranço: agressão sonora HxCx de respeito no primeiro EP, “Morte Assistida”
A música extrema, dos lados do punk, hardcore, crust e afins, sempre teve uma forte produção no Brasil. Dentro do espectro do underground obviamente, em que pese nomes como RDP e Garotos Podres já estiveram (e estão) com boa frequência em alguns canais de grande mídia.
Mas as características líricas e a massa pesada sonora que envolve tais estilos somente são apreciadas por mentes adeptas e calejadas com a porrada agressiva inerente dessa família musical.
E, em São José do Rio Preto, uma das bandas que se dedicam à tal arte moedora de tímpanos é a banda Ranço. Formada em 2023, a banda conta hoje com Thiago Saint (baixo e vocal), Fábio Bezerra (Guitarra) e Gustavo Lima (bateria), e lançou recentemente seu primeiro trabalho autoral, o EP “Morte Assistida”, com 7 faixas, com o puro suco do assalto hardcore.
Há pouco tempo para respiração, pois em sua grande totalidade as músicas te levam para agressão, veloz e pesada.
“Só é Mentira se Você não Acreditar” – já dispara riffs e bateria a 348 km/h. HxCx cru e direto, com vocais disparando gutural nos seus ouvidos. Ótimo cartão de apresentação.
“O Peso dos seus Atos” - Começa mais cadenciada, com bases esticadas. Isso até os 45 segundos, porque no restante dos 1m22, o trem acelera e se entrega ao crust.
“Vingança Pt 1” – Segue bem a vibe RDP, os vocais mais ardidos do que guturais. Na metade dá-se a luxo de umas passagens mais arrastadas.
“Hypando a Miséria” – Baixo encorpado na lata, e rifferama cortante. E caixa como sempre, sendo espancada.
“Aparelhos Escretores” - Há duas vozes se contrapondo. No final do ataque veloz, um cômico desfeche com uma frase “famosa” dita recentemente por uma “autoridade” política.
“Fascismo de Afeto” – Vem com considerável “calma” no começo e só dispara as metrancas nos 30 segundos restantes.
“O Penhor da Escravidão” - rifferama que incendeia. Há um lance no meio dos riffs isolando se intercalarem em L/R, e faixa até uma velocidade controlada (em comparação aos demais temas). É a faixa mais longa do disco, 2m53.
A coluna conversou com os integrantes da banda, que nos contou um pouco de sua trajetória, e seus planos atuais e futuros.
Ready to Rock) Conte-nos um pouco de como se formou o Ranço?
Ranço - Fabio: A banda começou com uma conversa entre o Eu e o Magal. Nos conhecíamos há muitos anos, mas sempre foi uma questão de oi e tchau, nada além de camaradas nos rolês. Combinamos de tentar fazer um som juntos, mas meio que não deu certo a princípio. Porém, ficou uma ideia no ar. “Porque não uma banda nova?” Nesse meio tempo acabei conhecendo o Thiago nos rolês que tinham no Two Tone em São José do Rio Preto. Ficávamos conversando na porta do bar, sempre que tinha um rolê de som podreira.
Como eu tinha ficado com essa ideia de montar uma banda nova na cabeça, pensei: Porque não uma banda nova com pessoas que nunca fiz um som antes? Ficou a ideia de um projeto novo. Onde inicialmente era um projeto de anti-música. Cheguei no Magal e falei do projeto, ele disse que nunca tinha feito algo assim, e que não conhecia muito do estilo, mas abraçaria a causa para a gente rolar um som juntos. Passado um tempo em um evento no Two Tone, que estava tocando a banda Terror Cult, fiz uma piada perto da banda, entre um intervalo de música. O Júnior Moreira, montado no auge de toda sua malvadeza que lhe é característica falou o nome da música: Bonebreaker. Falei para o Júnior: Imagina só, chegar no ouvido da cremosa e falar isso, desse jeitinho? “Bonebreaker” O Thiago que estava por perto assistindo o pessoal, deu risada. Isso de alguma forma, me encorajou a chamar ele para o projeto.
No final do rolê, conversamos:
Fábio: Você foi vocal de banda, né?
Thiago: De algumas por aí...
Fábio: O que você acha de ser vocal de uma banda, onde você só vai ter que ficar gritando?
Thiago: Você está querendo tirar um sorriso do meu rosto? Rs...
Fábio: Me passa o seu contato e vou te mostrar o que tenho em mente.
Com o Thiago, segui alguns meses apresentando o que estava pensando. Resumidamente mandei sons do Fear of God (o que seria a base do projeto) e Krigshot (até onde pensava em chegar).
Também conversava paralelamente com o Magal, mas sem nos aprofundarmos na questão das referências.
O projeto tinha tomado uma forma, estava com dois nomes na cabeça: Asco e Ranço.
Como seria anti-música pensem nesses termos, e optei por Ranço. Desenvolvi a logo da banda, montei um grupo no whatsapp e nos juntamos para montar o projeto.
O projeto deu uma esfriada, até um dia que o Magal puxou a fila, e marcou um ensaio.
Eu tinha na cabeça 2 riffs de guitarra para apresentar no ensaio e lá vimos que cada um tinha referências muito distintas e que precisaríamos achar um ponto de equilíbrio.
O equilíbrio da banda foi uma amizade muito foda que se formou e cada um foi dando ouvido e voz, para fazer o que estamos fazendo hoje.
RR) A banda lançou seu primeiro EP, “Morte Assistida”. Onde foi gravado e produzido?
R) Foi gravado e produzido em Fernandópolis, pelo Junior Moreira no seu estúdio, Covil do Terror.
RR) Temos a “Vingança Pt 1”. Teremos a parte 2? Se sim, porque a divisão?
R) Sim, existe, já está parcialmente gravada. A Ideia de dividir, foi para não fazer a música longa, e poder dar dinâmicas diferentes para elas, aproveitando o tema e explorando de maneira diferente, duas vinganças porque uma só não era o bastante.
RR) Dentro do universo hardcore tradicional, algumas músicas possuem algumas passagens mais cadenciadas em alguns momentos. Como se dá a composição das faixas? Todos contribuem?
R) A ideia do som é tentar colocar um pouco do que cada um gosta de ouvir. Construímos as músicas com base em um tema, ou em um riff que depois buscamos um tema para ele. Todos contribuem bastante, e todos ouvem estilos diferentes dentro do hardcore e metal, o que torna o som bem característico nosso, é uma simbiose dos 3.
RR) Parece que temos duas linhas vocais se contrapondo em algumas faixas. Quem faz cada uma?
R) As vozes são encargos do Thiago. Na gravação, optamos por deixar as duas linhas de vozes que ele faz ao vivo, mas optamos por sobrepor em alguns momentos na gravação. Para dar mais corpo e diferenciar do que é feito ao vivo.
RR) Nos conte sobre o conceito lírico de “Fascismo de Afeto”.
R) O fator motivador é baseado no que a maioria viveu nos últimos anos. Onde você chegava em um encontro familiar, e via aquele seu tio/tia/parente que você gostava muito na infância, numa conversa, somente destilando ódio, propagando mentiras e sendo grotescamente preconceituoso.
RR) Que fez a arte da capa? Teve um resultado gráfico/artístico excelente.
R) A Capa foi um desenho do Thiago. Ele mandou muito bem.
Thiago: eu geralmente gosto de me expressar pelas artes de maneira direta e gestual, eu desenho como faço os vocais, agressivamente e intuitivamente.
RR) O cenário político-social-econômico do Brasil sempre foi uma fonte inesgotável para conceber temas de protesto, universo comum no punk/hardcore. Nos dias de hoje, como esse cenário inspirou a criação dos temas do EP?
R) As redes sociais ajudaram ainda mais, pois ela já condensa tudo em um único lugar. Tem uma frase que gosto muito que diz: “As redes sociais não nos deixaram mais burros, só deixou a nossa burrice mais acessível.”
A todo momento você é bombardeado por temas. Eles caem no colo.
A polarização alimenta o ódio, inclusive estamos trabalhando em um material novo que vai abordar o ódio nas redes sociais
RR) Pela divulgação das redes, percebe-se que o Ranço tem feito vários shows nos últimos anos. Sabemos claro de toda dificuldade das bandas extremas de se apresentarem ao vivo. Como o Ranço tem trabalhado nesse sentido?
R) Sim, está acontecendo numa cadência saudável. Para conciliar o trabalho e as apresentações, mas a experiência de tocar ao vivo com bandas que tem mais de 30 anos no underground tem nos recompensado muito, faz todo o esforço valer a pena por poder expressar nossa arte.
RR) Há previsão de shows pelo resto do país, além da região de Rio Preto?
R) Estamos começando a desenvolver esse assunto. Nada confirmado, mas começamos a conversar com uma pessoa no Rio de Janeiro.
RR) Conte-nos um pouco da influência musical dos integrantes da banda.
R: Fábio: Punk, Anti-música, Goregrind, Post-punk, música experimental...
R: Magal: Thrash metal oitentista
R: Thiago: Deathcore, e New metal.
RR) Como tem sido a repercussão do lançamento de “Morte Assistida”?
R) Tem sido bem firmeza, até melhor do que imaginávamos. Enviamos para alguns curadores, e todos nos retornaram com mensagens muito positivas e de incentivo, inclusive temos ouvintes em todos os continentes, o que uma grata surpresa para um estilo não comercial.
RR) Quais os planos do Ranço para os próximos anos?
R) Continuar a produzir mais sons e talvez realizar um sonho de adolescente que é fazer algum festival internacional e de grande repercussão.
RR) Fique à vontade para deixar quaisquer outras informações sobre a banda.
R) A Ranço está presente no Instagram @bandarancooficial
E também no youtube @BandaRanço
A banda já dividiu palcos com nomes experientes da cena underground, como Dischord, Terror Cult e Eskrota.
Mesmo com pouco tempo de estrada, a banda se mostra com um entrosamento monstro, afiada na arte de compor e executar, com uma energia contagiante para rosnar protestos para o público do extremo. Se continuar nessa toada, será em breve mais uma força core para encarar (em termos de qualidade) os grandes nomes do estilo no Brasil.
CONTATOS
Instagram : https://www.instagram.com/bandarancooficial
Youtube: https://www.youtube.com/@BandaRan%C3%A7o
Spotify: https://open.spotify.com/intl-pt/artist/6Bdwzg9qBlpE2DQ34IJyPu
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